As Profundezas do Oceano: O Que Sabemos e Por Que É Tão Perigoso Explorá-lo?
Apenas 20% do fundo do mar foi mapeado. Entenda por que mergulhar nas profundezas é tão arriscado, o que já descobrimos e como a tecnologia está abrindo novos caminhos para a exploração submarina.
CIÊNCIA E TECNOLOGIA


Um mundo quase totalmente desconhecido
Apesar de cobrirem mais de 70% da superfície do planeta, as profundezas dos oceanos continuam sendo um dos maiores mistérios da Terra. De acordo com a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA), apenas cerca de 20% do fundo do mar foi mapeado com precisão. Isso significa que conhecemos melhor a superfície da Lua e de Marte do que o próprio planeta em que vivemos.
Explorar o oceano profundo é como tentar desbravar um novo universo. A cada metro descido, a pressão aumenta de forma extrema, as temperaturas despencam e a luz desaparece completamente criando um ambiente inóspito, perigoso e fascinante.
Por que é tão difícil explorar o fundo do mar
Viajar para o fundo do oceano é um empreendimento de alto risco. A cada 10 metros abaixo da superfície, a pressão aumenta em uma atmosfera cerca de 14,7 libras por polegada quadrada. No ponto mais profundo conhecido, o Challenger Deep, a mais de 10.900 metros de profundidade, a pressão é equivalente a 50 jatos jumbo esmagando uma embarcação.
Um pequeno defeito estrutural pode causar um desastre. Foi o que reacendeu as discussões após o desaparecimento do submersível Titan, da empresa OceanGate Expeditions, durante uma expedição aos destroços do Titanic. O caso mostrou o quanto a exploração humana das profundezas ainda é arriscada e limitada.
Além da pressão, o fundo do mar é escuro, frio e cheio de obstáculos geológicos. Mesmo com tecnologias modernas, como o sonar, localizar um submersível a 3.800 metros de profundidade é comparável a encontrar uma agulha em um palheiro, um processo lento e tecnicamente complexo.
A história da exploração oceânica
O desejo humano de conhecer o mar vem de longe. O primeiro submarino funcional foi construído em 1620 pelo engenheiro holandês Cornelis Drebbel, mas foi apenas em 1960 que o batiscafo Trieste desceu até o Challenger Deep, levando os exploradores Jacques Piccard e Don Walsh. Eles passaram cerca de três horas a mais de 10.900 metros de profundidade, observando criaturas vivas que desafiaram todas as expectativas da ciência.
Desde então, poucas missões retornaram a tais profundezas. Uma das mais famosas foi liderada por James Cameron, diretor de “Titanic”, que em 2012 fez uma descida solo até o fundo da Fossa das Marianas. Sua viagem destacou tanto o potencial quanto os perigos dessas aventuras extremas.
O que existe nas profundezas do oceano
As regiões mais profundas do oceano são chamadas de zona hadal, em referência a Hades, o deus grego do submundo. Nelas, não há luz solar, as temperaturas ficam perto de zero e as condições de vida são extremas.
Mesmo assim, a vida floresce. Foram descobertos anfípodes gigantes, pepinos-do-mar, vermes tubulares com sangue quente, caranguejos cegos e até organismos bioluminescentes que brilham no escuro. Esses seres vivem próximos a fontes hidrotermais, onde a água supera os 400°C, e obtêm energia não da luz solar, mas de reações químicas, um processo chamado quimiossíntese.
Esses ecossistemas alienígenas inspiraram até pesquisas sobre vida em outros planetas, como nos oceanos subterrâneos das luas de Júpiter (Europa) e Saturno (Encélado).
Tecnologia e inovação no fundo do mar
Com os avanços da engenharia, os cientistas agora utilizam submersíveis autônomos não tripulados e robôs de alta resistência capazes de suportar pressões 1.000 vezes superiores à da superfície. Essas máquinas coletam imagens, amostras de água e dados sobre o ecossistema marinho.
Iniciativas como o Seabed 2030, um projeto internacional que busca mapear todo o fundo do oceano até 2030, estão acelerando esse processo com ajuda de inteligência artificial, machine learning e imagens acústicas de alta resolução.
Essas tecnologias também são fundamentais para prever riscos sísmicos, entender correntes oceânicas e estudar mudanças climáticas, já que o oceano regula grande parte do clima global.
A ligação entre o oceano e a saúde humana
Pouca gente sabe, mas o oceano é uma verdadeira farmácia natural. Diversos medicamentos essenciais tiveram origem em organismos marinhos. Entre os exemplos:
Citarabina – derivada de uma esponja marinha, usada no tratamento da leucemia;
Ziconotida (Prialt) – analgésico potente criado a partir do veneno de caracóis marinhos;
PCR – técnica fundamental da biologia moderna desenvolvida com base em enzimas de microrganismos encontrados em fontes hidrotermais;
Proteína fluorescente verde (GFP) – descoberta em águas-vivas, usada em pesquisas sobre câncer e regeneração celular.
Os cientistas acreditam que o oceano pode guardar respostas para doenças ainda sem cura, incluindo novas substâncias antibióticas e terapias genéticas.
O futuro da exploração oceânica
Com o avanço da tecnologia, a exploração humana direta pode se tornar cada vez menos necessária. Robôs subaquáticos inteligentes e sensores de DNA contido na água do mar (eDNA) já estão revelando novas espécies e ecossistemas inteiros sem a necessidade de mergulhos tripulados.
Ainda assim, o oceano continua sendo o último grande território inexplorado da Terra. Apenas 240 mil espécies marinhas foram descritas, mas estima-se que existam mais de 2 milhões esperando para serem descobertas.
O desafio é equilibrar o desejo de exploração com a preservação ambiental, garantindo que o avanço científico não ameace a biodiversidade marinha.
Conclusão: o oceano, o espelho do nosso futuro
Explorar o fundo do mar é, em essência, explorar a nós mesmos. Cada nova descoberta nas profundezas revela como a vida é resiliente e adaptável e como ainda temos muito a aprender sobre o planeta que chamamos de lar.
O oceano guarda segredos sobre a origem da vida, sobre novas formas de cura e até sobre o futuro da humanidade. E talvez, ao compreendermos melhor suas profundezas, possamos também proteger o que temos na superfície.
Foto: Reprodução própria
Foto: Reprodução própria
